Quando nasce a obrigação tributária do ISS, ou seja, quando ocorre o fato gerador desse imposto? Seria no momento da finalização do serviço, na emissão da nota fiscal ou no recebimento do preço?
A Lei Complementar nº 116/2003, tal como o Decreto-Lei nº 406/1968, é omissa nesse aspecto. No entanto, é óbvio que esse aspecto é de suma relevância para se saber a partir de quando o sujeito passivo pode ser compelido a pagar o imposto ou, ainda, qual o dies a quo do prazo decadencial para o Fisco Municipal constituir o crédito tributário.
A Lei Complementar nº 87/1996, que versa nacionalmente sobre o ICMS, foi mais feliz ao prever expressamente o momento de ocorrência do fato gerador do ICMS em seu art. 12. Para esse estudo, é interessante transcrever os incisos V a VII, que tratam dos serviços tributáveis pelo ICMS:
Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto [ICMS] no momento: (…)
V – do início da prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, de qualquer natureza;
VI – do ato final do transporte iniciado no exterior;
VII – das prestações onerosas de serviços de comunicação, feita por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão e a ampliação de comunicação de qualquer natureza.
O art. 116 do Código Tributário Nacional traz disposição geral relativa ao momento de ocorrência do fato gerador (elemento temporal da hipótese de incidência):
“Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:
I – tratando-se de situação de fato, desde o momento em que se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios;
II – tratando-se da situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.”
O art. 117 esclarece a respeito do momento de ocorrência do fato gerador quando seu elemento material corresponder a uma “situação jurídica”:
“Art. 117. Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados:
I – sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento;
II – sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da celebração do negócio.”
Portanto, a questão acerca do momento de ocorrência do fato gerador do ISS passa pela própria materialidade do imposto: o imposto incide sobre a efetiva prestação de serviço ou pela só realização do contrato de prestação de serviço?
Sobre esse assunto, entendemos que o fato gerador somente ocorre com a efetiva prestação do serviço.
No REsp nº 4.962, j. em 17.8.1994, DJ de 19.9.1994, relator Ministro Gomes de Barros, a 1ª Turma do STJ decidiu que eventuais pagamentos recebidos pelo prestador antes da realização do serviço não dão direito ao Fisco de cobrar o imposto. Neste julgado, foi consignado expressamente que o fato gerador do ISS reside na efetiva prestação do serviço.
Se o serviço de construção civil for susceptível de medição parcial para cada etapa da obra, entendemos que haverá a incidência proporcional do ISS, eis que estarão verificadas as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios, tanto é verdade, que, para cada medição, o prestador do serviço fará jus à correspondente remuneração fixada no contrato.
Em favor da tributação do ISS de acordo com a medição, leciona Claudia Marchetti da Silva:
“É comum que na prestação de serviços de construção civil o contrato preveja etapas como a apresentação do projeto, terraplanagem, alicerces, acabamentos. Nesse caso, o aspecto temporal do ISS não será considerado apenas no final da obra, e sim por atividade de acordo com a medição, ou seja, a cada conclusão de serviço contratado, ainda que uma obra deva ser considerada como um todo indivisível.” (ISS, ICMS e IPI aplicáveis na construção civil. São Paulo: Fiscosoft Editora, 20154, p. 17).
Neste mesmo diapasão, ensina José Eduardo Soares de Melo:
“Na prestação de serviços de construção civil o contrato pode compreende etapas físicas determinadas: apresentação do projeto; movimento de terra; conclusão dos alicerces; levantamento da alvenaria; ou quaisquer outras, dependendo do tipo de obra que vai ser executado.
Assim, quando uma empresa contrata os serviços de empreitada de pavimentação de estrada, que se desenvolve ao longo de um período de tempo (12 meses), o aspecto temporal do ISS não será considerado apenas ao final da obra se a atividade for objeto de medição por etapas (a cada pavimentação de tantos quilômetros será devida uma parcela do preço do serviço), com a alocação dos respectivos valores contratados.”
Aires F. Barreto, que classifica os serviços em fracionáveis e não fracionáveis, assim comenta acerca da construção civil:
“O fracionamento pode consistir em etapas, fases ou trechos ou, ainda, em períodos de tempo. Tem-se fracionamento em etapas, por exemplo: quando contratado um serviço de construção civil para pavimentação de 10 quilômetros de estrada, ocorre a ultimação de 1 quilômetro. A conclusão desse trecho permitirá a incidência do ISS sobre essa extensão, mesmo que incompletas (ou até mesmo não iniciadas) as demais. Não se conclua, todavia, que todo serviço de construção civil seja fracionável. Se o serviço contratado fosse a execução de um prédio escolar, rigorosamente não seria possível o fracionamento, porque se tem aí obrigação de resultado. Sem a escola pronta não se há falar em prestação de serviço. Essa postura não é pacífica. É possível defender que, se há um cronograma de execução, e o tomador aceita (reconhece realizadas) as várias medições efetuadas, se tem, a cada uma delas, um fato suscetível de tributação, por via do ISS.”